130 - SANTANA

Não foi só mais um jogador vindo de África, mas sim uma das grandes estrelas do futebol benfiquista dos anos 60. Nascido na província de Benguela, seria no Sport Clube da Catumbela que as “Águias” iriam descobri-lo. Para Lisboa viria em 1954, onde, com 18 anos de idade, começaria pelas categorias de formação do clube da Luz. Decorridas 2 temporadas após a sua chegada, Santana, pela mão de Otto Glória, juntar-se-ia à equipa principal. Começava a desenhar-se aquele que viria a ser um grupo vencedor e não demoraria muito tempo até que o jovem nascido em Angola formasse com o capitão José Águas, uma dupla temível no ataque “encarnado”.
No entanto, e ao contrário do seu companheiro no sector mais avançado, Santana não tinha um corpo impressionante. Era baixo e de aspecto franzino, mas dessa fisionomia, apesar da desconfiança de certos treinadores, nunca haveria de emergir qualquer fraqueza. Muito pelo contrário, era no seu físico de ar débil que tinha a maior arma. Era nessa ligeireza que cabia toda a técnica que o caracterizava. Maior do que toda a habilidade, o que mais se destacava nele era a calma com que encarava os lances. Nessa sua tranquilidade, o atacante sabia dar a todas as jogadas, aos passes e a todos os toques na bola uma elegância fenomenal.
Nas competições europeias, já com Béla Guttmann ao comando equipa, lograria estrear-se em Edimburgo. Nessa temporada de 1960/61 brilharia. Durante o desenrolar da mesma, teria um papel deveras preponderante na conquista da Taça dos Clubes Campeões Europeus, marcando presença em todos os jogos da campanha e concretizando 4 golos, um deles na final de Berna, frente ao Barcelona. A chegada de Eusébio ao Benfica tirar-lhe-ia a titularidade. Continuaria, no entanto, a ser muito utilizado e preponderante nos objectivos do colectivo. Era quase sempre a primeira escolha para substituir algum dos seus colegas da linha avançada. Por essa razão, continuaria a marcar presença nos mais importantes momentos vividos pelo conjunto português. A prova da sua relevância sublinhar-se-ia com a presença nas finais europeias seguintes, tanto na vitória em 1962 frente ao Real Madrid, como na derrota de 1963 frente ao AC Milan.
Faltou-lhe no currículo a presença num grande certame para selecções. No entanto, com 5 internacionalizações e 1 golo, deu o seu contributo à "Equipa das Quinas" em algumas das fases de qualificação.

129 - JOSÉ AUGUSTO

"O meu pai jogava futebol no Barreirense, mas, a certa altura, ficou doente dos pulmões. Francisco Ferreira era seu compadre e levou o Benfica duas vezes ao Barreiro para angariar fundos para nos ajudar. Só admitia transferir-me para o Sporting ou para o FC Porto ou para qualquer outro clube se o Benfica me dissesse que não estava interessado"*. A promessa que fizera a ele próprio era uma forma de gratidão para com o emblema que na doença do seu pai, Alexandre de Almeida, auxiliara a sua família. Mas a vontade de representar o conjunto da “Luz” por pouco não se concretizava. O namoro com o extremo e nova estrela da colectividade da Margem Sul tinha começado bem antes. E se nas primeiras tentativas a exigência de 1000 contos foi adiando a saída do avançado, a despromoção da formação “alvirrubra” acabaria por transformar a sua transferência numa operação essencial para a sobrevivência do clube.
Segundo consta, já o atleta estava na Estação de Santa Apolónia com as malas aviadas para embarcar em direcção ao Porto, quando Manuel da Luz Afonso, responsável pelo futebol benfiquista, desvia José Augusto do seu destino. Com a vontade do jogador em vestir a camisola vermelha a assumir-se como prioritária perante qualquer outra hipótese, foi tão fácil convencê-lo a assinar contrato que a sua rubrica acabaria gravada numa folha em branco. Já no Benfica, depois de entrar em 1959, viveria muitos momentos de glória: venceria 8 Campeonatos Nacionais, 3 Taças de Portugal e seria, em duas vezes consecutivas, consagrado como campeão europeu de clubes.
Para além dos títulos, viveria também muitas histórias engraçadas. Numa delas, frente ao Sporting de Braga, seria preso. Naquele seu jeito rápido, excelente de técnica e visão de jogo, o extremo-direito, ao aproximar-se da linha de fundo, provavelmente para mais um dos seus mortíferos cruzamentos, é rasteirado sem que qualquer falta fosse assinalada. Nisto, um dos polícias que estava de serviço ao jogo, manda-o levantar-se do chão. Daí à troca de palavras e à ameaça de prisão, foi um instante. A promessa seria cumprida ao intervalo, com uma enorme confusão a eclodir no acesso aos balneários. O avançado e Mário Coluna, por razão da sua intervenção na defesa do colega, jogariam a segunda parte sob ordem de prisão. Porém, a melhor parte desse episódio ainda estava para vir! Quem é que teve de dormir em Braga e, no dia seguinte, ir responder a tribunal? Domiciano Cavém!
Os anos de José Augusto de "águia" ao peito fariam dele um dos mais futebolistas mais apreciados no mundo. Para além de premiado pela "France Football" como o melhor na sua posição, seria convocado para a selecção da FIFA por duas ocasiões. Claro, toda essa visibilidade, adicionada às finais Europeias disputadas, só poderia resultar na cobiça de outros clubes, como o Real Madrid. No entanto, nunca sairia do Benfica. Por lá terminaria a sua carreira de jogador e, ao substituir Otto Glória, iniciaria a sua caminhada como treinador.
Pela selecção, entre 45 internacionalizações e 9 golos, viveria o seu apogeu com a presença no Mundial de 1966, jogando todos as partidas de qualificação e da fase final da campanha dos "Magriços". No papel de treinador também estaria presente num dos grandes torneios internacionais. Ao integrar a comissão técnica de Portugal, ao lado de Fernando Cabrita, António Morais e Toni ajudaria a orientar a “equipa das quinas” no Euro 84.

*retirado de ”100 figuras do futebol português”, António Simões e Homero Serpa (A Bola), 1996

128 - CAVÉM

Foi difícil fugir ao fado do futebol depois de saber o pai Norberto Cavém (Lusitano VRSA e Olhanense) e o tio Diogo Barrocal (Lusitano VRSA) a correr os campos da bola. Terá sido isso que influenciou Domiciano Cavém... influenciou-o a ele, ao seu irmão Amílcar Cavém (Sporting da Covilhã) e ainda aos primos João Barrocal (Olhanense) e à outra glória benfiquista, Tamagnini Nené!
É sabido que o contexto familiar teve um papel preponderante nas suas escolhas. Tudo terá tomado contornos mais decisivos quando o seu pai, à altura treinador do Lusitano de Vila Real de Santo António, convidou o jovem jogador para fazer parte do conjunto que comandava. Já na sequência de 3 temporadas como sénior e com a descida de divisão do emblema algravio, o convite do Sporting da Covilhã levou-o a juntar-se ao seu irmão na cidade serrana. Daí ao Benfica foi apenas um passo e a glória, para um Cavém resistente, lutador, intrépido e brioso futebolista surgiu normalmente.
Na Luz, onde, entre 1955 e 1968, jogou na direita e na esquerda, no ataque, no meio-campo e até na defesa, fez parte da geração que disputou as 5 finais da Taça dos Clubes Campeões Europeus. Muito contribuiu para todas essas caminhadas. Porém, o golo marcado frente ao Barcelona, na final de Berna, terá sido um dos seus melhores momentos. Outro remate certeiro ficou igualmente famoso e ter marcado aos 15 segundos frente ao FC Porto, faz dele o recorde do golo mais rápido numa final da Taça de Portugal.
Caricata, ficaria também para a história a superstição da barba por fazer e as Taças dos Clubes Campeões Europeus ganhas pelos “Encarnados”. Segundo as palavras de Cavém, na noite anterior à final contra o Barcelona, “apareceu-me uma figura simpática, meio calva e com bigode, cujas feições me eram totalmente estranhas, aconselhando-me a não cortar a barba, no caso de querer vencer”*. No ano seguinte, sonho idêntico, onde "o velho semi-careca voltou a aparecer e ensinou-me como deveria marcar Di Stefano"*. O Benfica venceu essas duas edições. Já no que à derrota de 1963 frente ao AC Milan diz respeito, a conversa sempre foi outra e, por várias vezes, lamentou-se por não ter jogado de barba por fazer.

*retirado de “Almanaque do Benfica – Edição Centenário 1904-2004”, Rui Tovar,  Almanaxi (2003)

127 - NETO

"José Neto, um pequeno mas corajoso tipo de médio-ala que normalmente é referido como o Sr. Movimento Perpétuo". Seria assim que no programa vendido para o Hearts/Benfica, primeira partida da campanha vitoriosa do clube da “Luz” na Taça dos Campeões Europeus de 1960/61, o jogador do Benfica acabaria apresentado. De igual modo, reflectindo a sua entrega em campo, a revista "Ídolos do Desporto", anos mais tarde, apelidá-lo-ia com o epíteto "A formiga do Benfica".
Terão sido essas características, a de um atleta incansável, que levariam os donos da fábrica de cortiça onde trabalhava, a convencer Otto Glória a assistir a uma partida sua. Ao reconhecer no seu futebol qualidade suficiente para vestir a camisola das “Águias”, o seu patrão, Manuel da Luz Afonso, à data dirigente benfiquista, pediria ao treinador brasileiro para assistir ao jogo entre o Montijo e as “reservas” do Benfica. De imediato, a transferência ficaria acordada e, logo nessa época de 1958/59, consumar-se-ia a sua mudança do emblema da Margem Sul para os “Encarnados”. Durante as 8 temporadas seguintes, mesmo sabendo que nos anos sob a alçada de Fernando Riera pouco jogou, o voluntarismo do médio-direito auxiliaria o emblema lisboeta nas mais proeminentes conquistas.
Ainda assim, e com 2 vitórias na Taça dos Clubes Campeões Europeus a embelezar o seu currículo, há uma enorme pecha na carreira deste jogador. Porque, por esses tempos, para os ofícios defensivos estavam mais na berra os jogadores do Sporting, Neto nunca conseguiria somar uma chamada à selecção principal portuguesa. Tal aconteceria não por sua vontade, nem por falta de talento. A verdade é que, saído de uma das mais áureas gerações benfiquistas, o melhor que médio conseguiria seria 1 internacionalização ao serviço do conjunto “B” da “Equipa das Quinas”.

126 - CRUZ

Apesar de ter começado com o “verde e branco” do Sporting Clube da Liberdade, emblema de Campolide, seria o “vermelho” que acabaria por colorir a sua maior devoção desportiva.
Com 16 anos, e depois de descoberto pelas “Águias”, Fernando Cruz mudar-se-ia para o “Lar do Jogador”. Depois de 3 temporadas a habituar-se ao peso da camisola do Benfica, a revolução perpetrada por Béla Guttmann encontrá-lo-ia preparado para a responsabilidade de subir à equipa principal. No sector mais recuado ou meio-campo, principalmente no lado esquerdo do rectângulo de jogo, a sua competência rapidamente faria com que passasse a assumir um papel preponderante na manobra táctica do treinador húngaro. Num conjunto cheio de brilhantes executantes, o jovem jogador não deixaria intimidar-se. A bola não o atrapalhava. A ela entregava-se com a dureza típica dos defesas da sua época, mas ao contrário de muitos dos seus colegas de posição, era um intérprete de técnica evoluída.
As inúmeras metas ultrapassadas durante a sua carreira, depressa tornariam o mérito de um lugar no “onze”, numa normal farda de trabalho. Seria, no entanto, na sequência da titularidade conquistada bem cedo que medrariam toda uma série de êxitos. Na caminhada como futebolista, ao lado de Coluna e José Augusto, tornar-se-ia num dos 3 atletas que participariam em todas as 5 finais da Taça dos Clubes Campeões Europeus que o Benfica disputaria durante a década de 60. Às vitórias nas edições de 1961 e 1962 da referida competição, juntar-se-ia a glória de vencer 8 Campeonatos e 3 Taças de Portugal. Ainda assim, o tempo haveria de delimitar a sua vivência de “encarnado”. Depois de 11 anos como sénior, a sua paixão pelas “Águias” assumir-se-ia ainda mais na altura de tomar uma decisão para o resto da carreira. Quando chegou a dispensa, ao saber que seria incapaz de jogar contra o seu clube, recusaria todos os convites endereçados por emblemas portugueses e acabaria por vestir as cores dos franceses do Paris Saint-Germain.
Também a selecção faria parte do seu percurso. Chamado por Manuel da Luz Afonso, viajaria com os "Magriços" para Inglaterra. Mesmo sem ter sido utilizado pelo treinador Otto Glória, Cruz inscreveria o seu nome no rol de atletas que conquistariam para Portugal o 3º lugar no Mundial de 1966.

125 - ÂNGELO

Representava o Académico do Porto quando alguém do FC Porto convenceu o jovem de 15 anos, a rubricar pelo emblema do “Dragão” – “Foi um dirigente portista que me enganou, dizendo que tinha tudo tratado com o meu clube”*. Segundo consta, nada havia sido acordado e a grave trapaça valeu ao jogador a irradiação do futebol.
Anos passados, já Ângelo andava a fazer “tropa" em Santarém, quando um "olheiro" do Benfica deu com ele no Campeonato Militar. Depois de muitas diligências, o castigo acabou perdoado. Finalmente podia representar o clube que apoiava desde pequeno e que, quando ainda só pontapeava uma bola de trapos, ocupava nos seus sonhos um lugar predilecto.
Com a “Águia” ao peito, onde começaria a médio e acabaria a lateral, faria 13 temporadas. Entre Campeonatos, Taças de Portugal e 2 vitórias na Taça dos Clubes Campeões Europeus, o jogador viveu de “vermelho” quase todos os êxitos possíveis numa carreira. Porém, a sua caminhada não foi feita apenas de habilidade. O Estádio de Alvalade, num episódio mítico, assistiu a uma prova do seu querer. Numa disputa de bola, com uma entrada intempestiva virou tudo de pantanas… incluindo o vendedor de gelados!
Da fama de "sarrafeiro" nunca mais conseguiu livrar-se. No entanto, foi essa sua vontade que muito contribuiu para fazer de Ângelo uma das vedetas mais amadas não só dos benfiquistas, mas de todo o futebol português. Com a “camisola das quinas” jogaria vinte vezes, e apenas faltou no seu currículo a presença num dos grandes certames de selecções.
Já retirado da competição, a entrega que tinha demonstrado durante a sua carreira como atleta, valeu-lhe um lugar na estrutura do futebol juvenil do Benfica. Como treinador das camadas jovens, para além de conquistar inúmeros títulos, fez emergir para as gerações futuras, jogadores como Nené, Chalana, Humberto Coelho, Shéu ou João Alves. Todos eles acabaram por mostrar qualidades ímpares e, à imagem de Ângelo, sempre revelaram o verdadeiro espírito dos campeões.

*retirado do livro de João Malheiro, “Memorial Benfica 100 glórias”; Quidnovi (2004)

124 - GERMANO

Só chegou ao Benfica aos 27 anos. Na bagagem trazia a experiência de 9 temporadas nos seniores do Atlético. Ainda ao serviço do emblema de Alcântara, bairro onde nasceu, uma doença quase que hipotecava a sua carreira. Em 1956, atacado no sistema respiratório, passou por um internato tão prolongado que pôs-se em causa a sua continuidade no futebol. Porém, e quando tudo parecia fugir-lhe por entre os dedos, tenaz, venceu a maleita e regressou aos campos mesmo a tempo de ingressar no clube da “Luz”.
A sua primeira época no Benfica não poderia ter corrido melhor. Em 1960/61, a sua estreia coincidiu com a vitória na Taça dos Clubes Campeões Europeus. Para a referida conquista, muito contribuíram as suas exibições. À custa delas viria a ser considerado um dos melhores defesas-centrais do Mundo. Sem dúvida, Germano era completo. O atleta aliava a sua bravura a um bom domínio de bola e a uma capacidade de passe bem acima da média. Essas suas características fizeram dele um dos jogadores mais elegantes e de maior importância nas glórias benfiquistas.
Conquistou os principais títulos da sua carreira, nas duas primeiras épocas ao serviço das “Águias”. Mas há outro momento na sua caminhada com o Benfica, que muitos ainda recordam. Na final da Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1965, disputada frente ao Inter de Milão, Costa Pereira acabou por sair de campo lesionado. Numa altura em que as substituições ainda não faziam parte do futebol, Germano, reflectindo toda a sua abnegação, coragem e sentido de liderança, recuou no campo e, mesmo aleijado, continuou a partida na defesa das redes. Não ganhou o jogo, mas naquele desafio, sob a sua guarda, a baliza dos “Encarnados” não seria mais violada.
Foi esse seu crer, a maneira como assumia os riscos, que acabou por conferir ao defesa, na única partida que disputou no Mundial de 1966, o direito de envergar a braçadeira de capitão da selecção nacional. Todavia, muito para além da uma atitude exemplar dentro do campo, Germano também primou pela sua postura fora dele. Na sua vida privada, Germano soube privilegiar a cultura e os livros, acabando por, dessa maneira, conseguir destacar-se das demais estrelas de que foi colega.

123 - COSTA PEREIRA

Ainda no tempo do Ferroviário de Lourenço Marques, começaria a destacar-se por ser um praticante ecléctico! Na vela, mas principalmente no basquetebol e no futebol, Costa Pereira mostraria ser um exímio desportista.
No futebol daria os primeiros passos a jogar como avançado. Porém, a habilidade que as suas mãos demonstravam no ataque ao cesto, levariam o seu técnico no clube moçambicano a sugerir-lhe a baliza. Em boa hora viria a troca, pois Costa Pereira tornar-se-ia num dos maiores entre os postes. Nesse caminho, superaria vários "handicaps". Adaptaria os tiques de basquetebolista às suas novas funções, faltando-lhe vencer as reticências relativas à mudança de posição – “Quem sabe o que o futebol perdeu com a minha passagem a keeper? Talvez fosse hoje um avançado como me dizem ter sido o Soeiro, que eu não vi jogar, mas que me afirmam levava tudo na sua frente, graças ao poder físico que possuía”*.
No Benfica venceria tudo. Contra o Barcelona, em 1961, afastaria das redes benfiquistas um sem-número de bolas, numa final onde o trio magiar Kubala, Kocsis e Czibor semeariam o terror no meio-campo das “Águias”. No ano seguinte, nem os 3 golos do também húngaro Puskas assombrariam uma bela exibição sua e, muito menos, evitaram a segunda vitória dos “Encarnados” na Taça dos Clubes Campeões Europeus.
Já os dissabores viriam nos anos seguintes. O primeiro aconteceria na terceira final consecutiva, onde o Benfica, dessa feita contra o AC Milan, conheceria a derrota. No entanto, o pior desaire ainda estaria para vir. Em 1965, em mais uma presença no derradeiro jogo da Taça dos Clubes Campeões Europeus, um remate frouxo do brasileiro Jair, resultaria num "frango" tremendo de Costa Pereira. Para piorar o cenário já por si negativo, 12 minutos após o intervalo, o guarda-redes ressentir-se-ia de uma pancada sofrida na 1ª parte. Acabaria por sair e, ao não estarem ainda instituídas as substituições, veria o defesa Germano substituí-lo à baliza. O resultado de 1-0 não voltaria a alterar-se. Ainda assim, a chegada ao aeroporto de Lisboa, com os adeptos a ovacioná-lo, serviria para atenuar toda a má fortuna da peleja disputada no Giuseppe Meazza.
Para além do que já foi dito, Costa Pereira será para sempre recordado como um lutador dentro campo ou fora dele. Para além do que conseguiu no rectângulo de jogo, o guardião ficaria conhecido por defender os direitos dos colegas, acabando, tantas vezes, por ser comparado a um aguerrido sindicalista.

*retirado do livro de João Malheiro, “Memorial Benfica 100 glórias”; Quidnovi (2004)

122 - BÉLA GUTTMANN

Muitos anos antes dos seus afamados chazinhos terem valido ao húngaro as alcunhas "feiticeiro" ou "bruxo", ou ainda antes de ter conseguido sagrar-se bicampeão europeu, já Béla Guttmann tinha ganho o seu espaço na história do futebol.
Em 1919 começaria um trajecto como jogador que, ainda numa porção jeitosa, seria vivido no Campeonato norte-americano. Aos Estados Unidos da América chegaria numa “tournée” do SC Hakoah Wien, equipa de génese judaica e com a qual, com alguns colegas a acompanhá-lo na decisão, decidiria não regressar à Áustria. Nessa caminhada como futebolista, também teve o seu lugar na selecção magiar. Uma passagem mais discreta, mas, ainda assim, com a participação nos Jogos Olímpicos de Paris, em 1924.
Já como treinador, globalizou-se. Depois das passagens bem-sucedidas pela América do Sul ao serviço do São Paulo e do Quilmes, ou na Europa à frente do AC Milan, o técnico húngaro aterraria em Portugal. Após um ano no FC Porto, onde ganharia o Campeonato, o treinador iria atrás de uma proposta milionária e assinaria pelos rivais lisboetas. No Benfica, nos anos seguintes, patrocinaria uma verdadeira revolução. Ao dispensar cerca de 20 seniores, promoveria uma séria de novos atletas descobertos nos juniores das "Águias". Seriam esses jogadores a base para as 2 vitórias na Taça dos Clubes Campeões Europeus… Seriam esses jogadores e um tal avançado que, após uma conversa de barbearia com José Carlos Bauer, um antigo pupilo seu no São Paulo, Guttmann acabaria por desencantar em Moçambique.
Foi no Benfica que chegou ao topo e que sentiu a tão afamada mística – "Francamente, até pensava que não fosse nada, que não passasse de uma simples e vã palavra. Agora, porém, que a conheci, senti e vivi, afirmo-lhe que ela existe"*. Após a vitória de 1962, em São Bento, Guttmann e todos os jogadores foram condecorados. À saída diria a um dos vice-presidentes que iria demitir-se, pois não conseguiria treinar 14 comendadores. Abalou mesmo e antes de deixar a “Luz” haveria de proferir a famosa frase que, ainda hoje, é uma maldição – “Nem daqui a 100 anos uma equipa portuguesa será bicampeã europeia e o Benfica sem mim jamais ganhará uma Taça dos Campeões Europeus”**.

* retirado do artigo publicado em www.planetadofutebol.com, a 09/05/2001
**retirado do artigo publicado em www.record.pt, a 10/05/2003

50 ANOS DE BENFICA CAMPEÃO EUROPEU

No dia 31 de Maio cumprir-se-ão 50 anos sobre a primeira vitória do Benfica na Taça dos Clubes Campeões Europeus. A conquista afirmou o emblema português como um dos grandes do futebol mundial; sublinhou as "Águias", na herança da vitória na Taça Latina de 1950, como um clube capaz de derrubar os colossos da Europa.
Com o título, arrecado no que muitos apelidavam como os arrabaldes do "velho continente", exaltou-se todo um futebol que, durante a década de 60, afrontou velhos hábitos. Foram esses os verdadeiros anos de ouro. Neles, os brilharetes do Benfica e do Sporting nas competições internacionais, como a boa prestação da selecção nacional no Mundial de 1966, trouxeram para a montra toda uma série de heróis.
Meses antes da final de Berna, em Edimburgo, era dado, por um grupo quase incógnito, o primeiro passo dessa série de campanhas. É a eles que dedicamos este mês, o dos "50 anos de Benfica Campeão Europeu".

Ver também: Coluna; José Águas